FIM DO FORO ESPECIAL

SESSÃO DE 22/03/2017

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB – AL) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu peço, com muita humildade, Senador Cristovam, a atenção da Casa para uma comunicação que devo fazer como Líder da Bancada do PMDB.
Assumo esta tribuna, Sr. Presidente, para respeitosamente fazer algumas considerações e esclarecer, de uma vez por todas, informações imprecisas que circularam e que continuam circulando sobre investigações que tramitam no Supremo Tribunal Federal, muitas a partir de citações, por ouvir dizer, de pessoas que nem sequer conhecem os delatados ou nunca estiveram com os delatados, como é, Sr. Presidente – e exemplifico –, o meu caso.
Antes de mais nada, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, porém, presto uma homenagem sincera ao jurista Alexandre de Moraes, empossado hoje no cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, onde certamente irá cumprir importante e histórico papel.
Faço uma profissão de fé, Senador Cristovam Buarque, no Estado democrático de direito, que está no pórtico da nossa Constituição Federal e tem suas bases na garantia das liberdades civis e no respeito aos direitos humanos, e aproveito para uma breve incursão na organização governamental brasileira, fundada na divisão funcional do poder político.
Ao Poder Legislativo, Sr. Presidente e Srs. Senadores – o primeiro Poder, segundo a clássica doutrina de Montesquieu –, cumpre precipuamente elaborar as leis, normas de condutas gerais impessoais. Neste ponto, refiro-me ao importante papel do Senado Federal, nos quase 200 anos de sua história, na construção das instituições nacionais e na consolidação da República.
O Poder Executivo, Srs. Senadores, Senador Omar e Senadora Lídice da Mata, na lúcida observação do Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, é o árbitro da vida social, cujas opções governam a tudo e a todos – ou seja, é Governo mais Administração.
No modelo constitucional brasileiro, cabe ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição na proteção aos direitos fundamentais.
Como Deputado Constituinte, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, colaborei para a ampliação e fortalecimento das prerrogativas do Poder Judiciário e do Ministério Público, além do status constitucional conferido à Advocacia, indispensável à administração da justiça, e ao prestígio destinado à Defensoria Pública como instituição essencial à função jurisdicional.
Ao Ministério Público, Sr. Presidente, instituição da democracia que, como admitiu Norberto Bobbio, é o governo cujos atos se desenvolvem em público sob o controle da opinião pública, também destinei, ao longo desses anos, os meus melhores esforços.
Como Deputado Constituinte, Senador Jader Barbalho, convicto da importância da independência funcional na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, ajudei a assegurar a inamovibilidade, a vitaliciedade e a irredutibilidade de vencimentos dos membros do Ministério Público.
Como Ministro da Justiça, estabeleci parcerias com o Ministério Público no combate ao crime organizado e à falsificação de remédios, na defesa do consumidor, no fortalecimento da Polícia Federal e na repatriação de brasileiros.
Permitam-me, Senador Ronaldo Caiado, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, contar um caso. Quando Ministro da Justiça, convenci o Presidente Fernando Henrique Cardoso de que a Policia Federal não poderia conviver com o crime e que o Poder Público, o Governo, o Ministério da Justiça, a quem cabe a chefia da instituição, não poderia designar para investigações do dia a dia delegados e agentes comprometidos com o crime organizado. E, com essa medida provisória editada pelo Presidente Fernando Henrique, como Ministro da Justiça, nós afastamos, Senador Cristovam Buarque, de uma só vez, numa operação com o Ministério Público, 60 agentes, delegados e superintendentes da Polícia Federal, em nome da instituição, com apoio total da instituição. Criminosos contumazes não podiam continuar sendo designados para investigar crimes – seria a mais brutal contradição da Polícia Federal.
Talvez por isso, Srs. Senadores, me inquiete ao perceber o uso político da instituição em alguns casos. Se a Constituição veda aos membros do Ministério Público exercerem atividade político-partidária, com maior razão, ela proíbe que o órgão seja utilizado como instrumento de disputa política em benefício ou em detrimento de quem quer que seja, Senador João Alberto. Vários juristas de renome, Senador Edison Lobão, vêm demonstrando preocupação com o denuncismo e a desinformação, com o beneplácito de autoridades que protagonizam vazamentos seletivos de processos sob segredo de Justiça, jamais investigados, sem tempo para concluir a investigação, e manobras, Srs. Senadores, Srªs. Senadoras, para trancar ou destrancar inquéritos conforme suas conveniências.
A revista Consultor Jurídico, de 27 de novembro do ano passado, fala do trágico episódio de um jovem executivo da OAS que teve sua vida totalmente arruinada. Preso para delatar, sem provas, foi arrastado para a desgraça. Inocente, pagou o pato e foi condenado a 11 anos de cadeia. Até ser absolvido pelo Tribunal Regional Federal, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, amargou as piores situações: sofreu tortura psicológica, perdeu o emprego, o casamento, afastamento compulsório da filha pequena e, de quebra, embora inocente, vai carregar pelo resto da vida a marca do ex-presidiário.
É o resultado, Sr. Presidente, inevitável dessa histeria investigativa e de inquéritos que se perpetuam no tempo, que não terminam nunca, repito, em detrimento do princípio da duração razoável do processo e da própria investigação. É o resultado triste da generalização de medir todos pela mesma régua, de não separar o joio do trigo, de colocar na mesma vala o bandido e o inocente.
Basta, Sr. Presidente e Srs. Senadores, esse único caso – há outros certamente, não sei se a maioria – para colocar em xeque o método da prisão preventiva para forçar confissões e delações, estratégia admitida sem qualquer reserva pelo Ministério Público Federal e pelo juiz de primeira instância, em muitos casos usurpando a própria competência do Supremo Tribunal Federal.
Nesse contexto esquizofrênico, temos a desastrada operação há pouco referida pelo Senador Ronaldo Caiado, a Operação Carne Fraca, deflagrada na semana passada pela Polícia Federal e não apenas pela Polícia Federal, mas pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, pelo juizado de primeira instância e pela imprensa, Srs. Senadores, pela imprensa, com uma repetida veiculação que objetiva massificar a inverdade. É esse o fato com que nós estamos lidando no dia a dia.
E temos agora até mesmo as operações fantasmas, operações fantasmas. Digo isso, porque, ontem mesmo, divulgou-se, com alarde e insistência, que endereços e pessoas próximas a mim estavam sendo objeto de busca e apreensão sem que nada, absolutamente nada, tivesse ocorrido.
Reitero, Sr. Presidente, Srs. Senadores, em alto e bom som, para evitar conclusões apressadas ou maldosas, o que já disse várias vezes: considero a Lava Jato, como qualquer outra investigação criminal intocável, intocável. Eu tenho dito isso aqui e repetido várias vezes. Elas corrigem desvios, fraudes e descaminhos, mas ninguém, Sr. Presidente, absolutamente ninguém, está livre de críticas – nem a Lava Jato. Nos Parlamentos, nós convivemos diuturnamente com elas, algumas maldosas e injustas, mas procuramos recebê-las todas com humildade e como oportunidade de amadurecimento e aperfeiçoamento. Todas as operações contam com meu apoio. E eu já disse desta tribuna e queria repetir, Senador Cristovam, Senador Jorge Viana, que, como delatado, eu entendo que é a investigação o caminho único para que se possa esclarecer esses fatos.
Meus aplausos se destinam, Sr. Presidente, ao exercício dos meios investigativos nos limites da lei e minhas críticas se dirigem a alguns métodos que excedem essas fronteiras e são tidos, por alguns, inclusive deste Parlamento, como um mal necessário, mal necessário. O pensador italiano – e me permitam citá-lo novamente – Norberto Bobbio, num de seus magistrais ensaios, nos lembra que os meios maus corrompem até os melhores fins.
Hipólito da Costa, considerado o fundador do jornalismo brasileiro, nos idos de 1800, ficou preso dois anos e meio nos cárceres sujos da Inquisição, acusado de pertencer à Maçonaria.
Aqui, Sr. Presidente, Srs. Senadores, aproveito para abrir parêntese e recordar o caso do blogueiro que foi constrangido na data de ontem a revelar suas fontes. E vejam só: nos dias de hoje.
Quando os Srs. Senadores e as Srªs. Senadoras me elegeram Presidente desta Casa, no primeiro desses dois últimos mandatos, eu fiz questão de dizer ali, no momento em que tomava posse, que, como Presidente do Congresso Nacional, eu tinha um único compromisso que levaria comigo até o fim: qualquer abuso que houvesse contra a liberdade de expressão, pilar fundamental da democracia, contaria com a interdição do Presidente do Congresso Nacional.
E, ontem, Sr. Presidente, eu vi meios de comunicação conhecidos no País como os defensores da liberdade de expressão e da democracia falarem mal do blogueiro, discutirem se o blogueiro era ou não era jornalista, porque disso dependia a liberdade de expressão.
Sobre essas prisões, Srs. Senadores, escreveu o jornalista, escritor e advogado Pedro Braga: “O Tribunal do Santo Ofício”, no qual Hipólito foi preso, “mantinha pessoas sem culpa formada, sem provas de nenhum crime, apenas por mera conjectura de supostos delitos ou delação incentivada pelos seus ministros da Inquisição”. E lembrou, Senador Cristovam: “O inquisidor era, ao mesmo tempo, acusador e juiz”.
Por isso, não é de sobressaltar quando ouvimos o Juiz Moro dizer que o ex-Presidente Lula não será candidato nem no Brasil nem em lugar nenhum, quando ouvimos o representante do Ministério Público, Dallagnol, dizer que, até maio, o ex-Presidente Lula terá de ser julgado e condenado, porque não pode ser candidato à Presidência da República.
Aqui, Sr. Presidente, Srs. Senadores, as práticas do século XIX se encontram com o século XXI. Perplexo, percebo seguidas tentativas de me jogar num ambiente de manipulação, vazamentos, embustes e publicidade opressiva em que se multiplicam inquéritos instaurados sem um fiapo sequer de prova, a partir de meras alusões mentirosas e irresponsáveis de alguns delatores premiados.
Tais delatores, Sr. Presidente e Srs. Senadores, garantem a sua impunidade, lavam patrimônios roubados e recebem anistias que somente este Poder Legislativo pode conceder. É prerrogativa, é competência do Poder Legislativo a concessão de anistia, como fizemos aqui na semana que passou com a segunda repatriação de 2017. Só o Poder Legislativo pode conceder anistia. Como pode, Sr. Presidente, o Ministério Público, a pretexto de uma narrativa, de uma delação sem provas, conceder anistia e, pior, com essas decisões, possibilitar a lavagem de dinheiro público roubado, como aconteceu com vários delatores? Isso é o fim do mundo, isso não pode continuar. Tais delatores, Sr. Presidente, garantem a sua impunidade, lavam patrimônios e recebem anistia que só, repito, o Poder Legislativo pode conceder.
Na verdade, a quantidade de investigações é inversamente proporcional à substância do que nelas se propaga. Tenho visto muitos comentários, Senador Jorge Viana, graves de pessoas que nem mesmo, ao menos, se preocupam em ler os autos, quase todos de domínio público, repetindo o que é divulgado. É aquela coisa cretina de “a cavalo dado não se olham os dentes”.
Há 56 anos, O Globo – e me permitam citar aqui O Globo – publicou uma crônica de Rubem Braga versando sobre as centenas de inquéritos midiatizados que Jânio Quadros mandou instaurar para varrer a corrupção do País. Foi nesse contexto, Sr. Presidente, que o maior cronista brasileiro advertiu que – aspas: “Abrir inquéritos a torto e a direito, sem que em cada caso haja uma presunção bastante fundada de irregularidade grave e apurável, isso não me parece boa política. E também não me parece justo apontar nomes de cidadãos à censura pública antes de ter a certeza de não estar cometendo uma injustiça”.
Os alagoanos e os brasileiros estejam certos, absolutamente certos, de que jamais, apesar das tentativas, conseguirão provar nada contra mim, exatamente, Sr. Presidente, exatamente, Srs. Senadores, porque nunca cometi nenhum crime.
Setores do Ministério Público, movidos pelo preconceito, se dedicam a promover o desgaste da minha imagem pelo grande volume de investigações com base apenas em “ouvi dizer”, “provavelmente”, “eu interpretei”, “pessoas comentavam”, “eu subentendi”, “eu entendi”, “pode ser que sim”, “levou a acreditar”, “conversas de mercado diziam”, “depreende”, “era dito aos quatro ventos”, além de fabricar, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs. Senadoras, incidentes absolutamente dispensáveis.
Houve pedido de prisão seguido de vazamento e publicidade opressiva para emparedar o Ministro Teori Zavascki, que indeferiu a medida extravagante. Os mesmos ingredientes serviram, Sr. Presidente, pasme, para o pedido seguido de busca e apreensão, igualmente negado por um saudoso magistrado que se pautava pela lei e não pelo estrépito dos meios de comunicação.
As atitudes pouco sóbrias de dirigentes do Ministério Público Federal, permitam-me dizer, começaram, Srs. Senadores, em 2013, a partir de quando passei a ser vítima de constrangimentos e prejulgamentos preconceituosos, como aconteceu com vários Senadores. Um inquérito instaurado a meu pedido, em 2007, e muitos aqui se lembram, envolvendo delicada questão da minha vida pessoal, particular, dormiu, Sr. Presidente, por mais de sete anos na Procuradoria-Geral da República e acordou num solavanco, em pleno recesso do Supremo Tribunal Federal, a sete dias das eleições para a Presidência do Senado Federal. Exatamente, a denúncia, usada para favorecer um colega do então Procurador-Geral da República, que era candidato a Presidente desta Casa, nosso querido amigo Pedro Taques, foi protocolada sem documentos que o Ministério Público dizia indispensáveis para a denúncia, para a representação, e, nesses sete anos de inércia, não se preocupou em obtê-los. Nos sete anos, Senador Lobão, não se preocupou em obtê-los.
Escancarando, Srs. Senadores, o desvio de finalidade, o subscritor da denúncia, Procurador Roberto Gurgel, se apressou em ocupar o noticiário nacional, na véspera da eleição para a Presidência do Senado Federal, para conceder, Senadora Lúcia Vânia, entrevistas sobre o assunto de caráter sigiloso que conhecia em razão do cargo que ocupava, violando descarada e impunemente a lei, para beneficiar o seu colega candidato à Presidência do Senado Federal.
Esse mesmo personagem, já aposentado e afastado das suas funções, movido por inexplicável obsessão, não se conteve e, em março de 2016, deu entrevista à Folha de S.Paulo e ao UOL, imputando injustamente responsabilidade – pasmem! – ao Supremo Tribunal Federal pela demora do julgamento de recebimento da denúncia, denúncia essa que tinha passado mais de sete anos dormindo, dormitando na gaveta do Procurador-Geral da República.
A denúncia, Sr. Presidente, como dizia, reproduziu tão somente um drama familiar. Pautada, a meu pedido, para a sessão de julgamento de 1º de dezembro de 2016, tida por precária e capenga até pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, foi parcialmente recebida.
Diziam que eu havia falsificado notas fiscais para aumentar os rendimentos. E sequer essa denúncia foi colocada a termo para apreciação do Supremo Tribunal Federal. Diziam que eu havia tido ajuda de uma empresa para pagar despesas de ordem pessoal. E isso sequer foi colocado na acusação.
Receberam a denúncia, Sr. Presidente, e hoje a imprensa continua a repetir que o Senador Renan Calheiros, réu no Supremo Tribunal Federal, acusado de receber dinheiro de uma empreiteira. Receberam a denúncia pondo em dúvida a minha verba indenizatória como Senador, na contratação de uma locadora que prestou serviços ao meu escritório no Estado de Alagoas, dizendo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que aquele serviço não havia sido prestado, Senador Anastasia. Portanto, eu havia cometido um peculato porque a empresa não existia.
Nós fomos obrigados a fazer a prova negativa, a prova contrária. A empresa existia há 19 anos, Senador Aécio Neves, e ainda existe; e ainda existe. E o serviço havia sido prestado e as notas fiscais haviam sido auditadas. Aí eles disseram assim: “Mas não pode. Isso é criminoso. Cometeu peculato porque a indenização do serviço prestado, depois de ressarcido pelo Senado Federal, havia sido paga [Senador Requião], em dinheiro.”
Ora, quando um Senador contrata uma prestação de serviços, seja de quem for, a empresa, para emitir a nota, ela recebe primeiro, senão ela corre o risco de emitir uma nota fiscal e depois não receber a indenização pelos serviços prestados.
E eu, Sr. Presidente, quando uso a verba indenizatória, eu uso e saco na totalidade da verba indenizatória, exatamente para ressarcir esses serviços que são contratados e que são prestados.
Vários Ministros que receberam a denúncia disseram assim: “Vamos receber. Há uma pressão muito grande para que a denúncia seja recebida”. Mas isso, no mínimo, no mínimo – e ouso citar novamente o Ministro Teori Zavascki –, no mínimo isso é uma criação do Ministério Público Federal.
Houve, Srs. Senadores, desdobramento bizarro com a decisão do Ministro Marco Aurélio, determinando o meu afastamento da Presidência do Congresso Nacional em 5 de dezembro, a seis dias úteis do término do meu mandato. A Mesa do Senado reagiu, e o Supremo Tribunal Federal tornou sem efeito a liminar.
Nos últimos dez anos fui submetido, como todos acompanham, Senador Jorge Viana, a grande sofrimento pessoal e familiar com a divulgação, nos noticiários, de que eu seria julgado por crimes gravíssimos, que nem – repito aqui o que disse anteriormente – constavam das denúncias. Mesmo assim, setores da mídia continuam a divulgar a inverdade.
A sucessiva abertura de inquéritos; o pedido de quebra de sigilo bancário e fiscal, meses depois da sua entrega espontânea, por escrito, ao Ministro Teori Zavascki; o pedido de busca e apreensão e de prisão preventiva, sem justificativa minimamente razoável; a insistência no pedido de afastamento da Presidência do Senado Federal, dias depois de o Supremo Tribunal Federal decidir em contrário; e a denúncia inventada, no apagar das luzes, do ano de 2016, são episódios dessa deslealdade, Senador Romero Jucá, dessas arbitrariedades.
Elio Gaspari – e é importante que todos ouçam isto – recorda que Teori Zavascki tinha, por hábito, fazer pequenas anotações, e algumas delas revelavam a sua insatisfação com atitudes do Procurador-Geral da República.
Luis Nassif também registra que os maiores conflitos do eminente e saudoso Ministro Teori Zavascki foram exatamente com o chefe do Ministério Público Federal.
As rejeições pelo Senado – e isso é muito importante que mais uma vez se diga –, as rejeições pelo Senado Federal dos nomes dos Procuradores Vladimir Aras, Wellington Saraiva e Nicolao Dino, indicados pelo Procurador-Geral da República para o Conselho Nacional do Ministério Público, motivaram, Sr. Presidente, Srs. Senadores, várias atitudes de retaliação, sob o mais baixo nível do corporativismo que minha condição de Senador, representante de Alagoas, me obriga a confrontar.
Vários acontecimentos revelam que o Procurador-Geral da República promoveu, estimulou e acobertou vazamentos, jamais apurados, de dados mantidos sob segredo de Justiça. Demandou prisão preventiva com base em simples presunções e, sem suficiência probatória apta, pediu busca e apreensão, sem antes adotar diligências complementares. Ingressou com denúncias sem o inquérito. E, por fim, Sr. Presidente, Srs. Senadores, solicitou, repito, o meu afastamento da Presidência do Senado, com o mesmo fundamento já repelido pelo Supremo Tribunal Federal.
Nesse cenário, inclui-se o pedido de quebra do meu sigilo bancário e fiscal em 11 de novembro de 2015, apesar de ter conhecimento de que, desde o dia 14 de maio de 2015, já os havia oferecido espontaneamente, por escrito, ao Ministro Teori Zavascki.
O deferimento da medida pelo então Relator, induzido ao erro pelo Ministério Público Federal, foi explorado dias a fio pela mídia, tentando me colocar em situação vexatória perante a opinião pública.
Nos meses de fevereiro e março de 2016, Sr. Presidente, houve uso ilegal de escutas por um ex-Senador, provavelmente ou certamente pautado, e seus três filhos, já em tratativas para colaboração. Acabou esse ex-Senador premiado com um generoso acordo, que suspeita-se pode ter significado a devolução de R$60 milhões e a lavagem de R$700 milhões roubados de dinheiro público.
A cláusula, Srs. Senadores, em que as partes se comprometem a preservar o sigilo sobre os áudios foi violada e os diálogos vazados e divulgados com estardalhaço em noticiários nacionais de televisão, blogs, jornais e revistas de grande circulação, por várias edições seguidas, a partir de 26 de maio de 2016, sendo que o segredo apenas foi revogado no dia 14 de junho de 2016.
A nítida intenção, como todos sabem, era influenciar a opinião pública e, assim, pressionar o então Ministro Relator a determinar a prisão do então Presidente do Congresso Nacional, requerida pelo Procurador-Geral da República, em 23 de maio de 2016, com base, pasmem, nos mesmos áudios vazados para a mídia, e divulgados, com ênfase, de que havia coisas gravíssimas contra o Renan.
Percebendo a manobra, o saudoso Ministro Teori Zavascki, que com sua conduta serena, isenta, equilibrada e imparcial, honrou o País e a magistratura brasileira, indeferiu o pleito em decisão firme, em que registrou – aspas – “que a credibilidade das instituições, especialmente do Poder Judiciário, somente se fortalecerá na exata medida em que for capaz de manter o regime de estrito cumprimento da lei” – fecha aspas.
Respondo, Sr. Presidente, a um inquérito maluco instaurado no delírio de um tal Ceará, um delator, um tal Ceará, que não me conhece, nunca esteve comigo, nunca me viu. Esse mesmo criminoso citou perversamente – não vejo aqui o Senador Randolfe Rodrigues – dois outros Senadores em situação idêntica. O Procurador-Geral da República determinou corretamente o arquivamento em relação aos outros dois Senadores, argumentando que as informações eram insuficientes para indicar, de modo concreto e objetivo, a autoria de crimes, mas, curiosamente, não usou o mesmo método comigo, deixou prosseguir a minha investigação num caso semelhante, com a mesma negativa pela Procuradoria Geral da República.
Nesses dias, Srs. Senadores, vazaram o trecho de um suposto depoimento de um delator que teria repassado dinheiro para a campanha eleitoral do Governo de Alagoas.
Primeiro, as doações que o Partido recebeu de empresas foram todas legais e contabilizadas. Segundo, Sr. Presidente, o Governador de Alagoas jamais se envolveu com a captação de recursos. As consultas às empresas para doação na campanha eleitoral, Senador Requião, em 2014, foram todas feitas por mim, como Presidente regional do Partido.
O Governador de Alagoas é um jovem governador determinado, é o governador que tem a melhor avaliação de todos os governadores do Brasil. Ele conseguiu, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, o inédito de transformar a situação fiscal de Alagoas, Senador Anastasia, em dois anos, dois anos. E dois anos de crise econômica, social e de desemprego. E como a economia de Alagoas, Senador Fernando Bezerra, é uma economia frágil, uma das mais frágeis dos Estados brasileiros, ainda teve que, cumulativamente, administrar isso.
O Estado de Alagoas, para quem não sabe, tem a maior dívida de todos os Estados do Nordeste do Brasil. Para que os senhores tenham uma ideia do montante dessa dívida, a dívida de Alagoas equivale, é exatamente igual, à dívida de todos os Estados do Nordeste somada, somada, somada.
E o Governador de Alagoas, Sr. Presidente, quando assumiu o Governo, o Estado de Alagoas tinha a maior proporção de despesa de pessoal com a arrecadação, com a receita do Estado. Em dois anos ele fez uma virada. A arrecadação própria cresceu 17% nos dois anos de crise, porque ele remontou a fiscalização.
Sr. Presidente, nós administramos aqui, Senador Fernando Bezerra, com a sua ajuda e de muitos Senadores, a pauta federativa, conseguimos trocar o indexador da dívida, conseguimos renegociar a dívida com um prazo de carência de sete meses. Agora voltou a ser descontado novamente mais 20%, 20%. Aprovamos os depósitos judiciais e a repatriação com a participação dos Estados. Depois, nós conseguimos, com o Presidente da República, todos nós, não apenas o Senador Renan, antecipar o pagamento da multa. E o Estado de Alagoas, pasmem, nessa situação, é hoje um dos Estados, do ponto de vista fiscal, mais equilibrados do Brasil. Com certeza, de recursos próprios para investimento, o Estado de Alagoas, nesses dois anos, é o que mais tem recursos próprios para fazer investimento em infraestrutura. Tem mais de 70 ações de infraestrutura rodoviária que estão, cumulativamente, sendo feitas.
E o noticiário, Sr. Presidente, expõe um jovem com essa dedicação, com esses resultados, para estigmatizar na opinião pública. Exatamente o Governador, Senador Aécio, melhor avaliado do País, de acordo com as pesquisas feitas pelo Instituto Paraná, no ano que passou e neste ano também.
Isso é inconcebível, não dá para concordar com isso. A imprensa passa o dia inteiro insinuando que há denúncias contra mim e, ao final e ao cabo, diz que um delator havia confessado – e a gente não tem acesso a essas informações, a não ser pelo YouTube, pelas redes sociais –, que eu havia pedido R$500 mil, que foi doado ao diretório nacional, formalmente ao diretório nacional, e que, como não tem narrativa a fazer, a única alusão que tem é essa doação feita na forma da lei.
Ele diz assim: “Mas essa doação, esse dinheiro pedido para a campanha do Governador de Alagoas depende da obra tal, da obra qual”. Isso é uma coisa inominável! Isso é uma brutalidade, um absurdo!
Como podem homens públicos, Sr. Presidente, ficar expostos a esse tipo de noticiário, sem ter acesso ao conteúdo das investigações, respondendo às investigações pelo que é publicado pelos blogues e pela mídia social.
Jamais – Sr. Presidente, me permita repetir –, jamais me opus a qualquer investigação, tendo até mesmo pedido, como eu disse aqui, o inquérito de 2007 para me investigar. Na oportunidade, como todos sabem, entreguei todos os meus documentos.
Nos casos da Operação Lava Jato e Zelotes, sempre adotei postura colaborativa: prestei quatro depoimentos à Polícia Federal, sem deixar de responder a qualquer pergunta – e prestarei, Srs. Senadores, quantos mais forem necessários.
Mesmo quando me foi facultado prestar depoimento por escrito, porque era Presidente do Senado Federal, eu fiz questão de comparecer pessoalmente. Basta, Sr. Presidente, me convocar – eu já disse isso, queria repetir: basta me convocar, basta pedir que disponibilizarei, Srs. Senadores, quaisquer dados ou informações, seja de computador, seja de telefone, seja de WhatsApp, seja o que for.
Vazamentos seletivos, de acordo com colaboração premiada e depoimentos sob sigilo, ocorrem de forma sistemática, impunemente, apesar de o próprio Procurador-Geral da República considerá-los, nas entrevistas repetidas, de gravidade ímpar – gravidade ímpar!
Essa era outra coisa, Sr. Presidente, que incomodava o Ministro Teori Zavascki. Ao afastar liminarmente a possibilidade de o vazamento ter partido do Ministério Público, o Procurador-Geral expunha o Supremo Tribunal Federal e o sempre cuidadoso Ministro Teori Zavascki.
A estratégia dos órgãos repressores é erguer um cenário de medo, a partir da prisão preventiva, para obter a colaboração supostamente voluntária de investigados, depois de vazadas seletivamente para a mídia. É sempre o mesmo caminho! Esse caminho não se altera, esse caminho é sempre o caminho adotado em todos os fatos.
Seguem-se, Sr. Presidente, rigorosamente, métodos consagrados em artigo por um jovem juiz brilhante, no ano de 2004, a pretexto de analisar a Operação Mãos Limpas e compará-la às circunstâncias brasileiras, onde se lê, aspas – Juiz Moro, Senador Requião: “A estratégia de investigação adotada desde o início do inquérito submetia os suspeitos à pressão de tomar decisão quanto a confessar, espalhando a suspeita de que outros já teriam confessado e levantado a perspectiva de permanência na prisão pelo menos no período da custódia preventiva no caso da manutenção do silêncio ou, vice-versa, de soltura imediata no caso de uma confissão”.
E continua o Juiz Moro: “Os responsáveis pela Operação Mani Pulite ainda fizeram largo uso da imprensa. Com efeito: para o desgosto dos líderes do PSI (Partido Socialista Italiano), que, por certo, nunca pararam de manipular a imprensa, a investigação da ‘mani pulite’ vazava como uma peneira”.
Quando o Juiz Moro veio aqui, por iniciativa do Senado Federal, para uma sessão temática – e mais uma vez eu quero agradecer ao Juiz Moro por sua presença –, eu fiz uma pergunta a ele: “Eu li um artigo, Juiz Moro – aliás, muito bem escrito –, se não me engano de 2004/2005, em que o senhor dizia que as condições da Itália para uma faxina no sistema representativo eram as mesmas do Brasil, porque tanto lá quanto cá havia uma corrupção sistêmica e que precisava ser combatida. E o senhor, no artigo brilhante, bem escrito, defendia que a presunção de inocência tem que ter limite. Ela não pode ser absoluta, como diz a Constituição. E que a maneira de minar o sistema representativo nas investigações é fazendo vazamento para a imprensa amiga – fazendo vazamento para a imprensa amiga! Eu queria que o senhor falasse um pouco sobre esse artigo e sobre os conceitos que V. Exª continua a defender. Ou se V. Exª já mudou, não pensa mais conforme escreveu nesse artigo de 2004/2005, eu gostaria de dizer que a pergunta não tem sentido”.
O Juiz Moro, Senador Humberto, respondeu a algumas perguntas que haviam sido feitas e se voltou para mim – o Senador Requião estava sentado ao lado – e disse assim: “Presidente, eu queria lhe fazer um pedido. Se o senhor permitisse, eu queria lhe fazer um pedido”. “Pois não, Juiz Moro”. Ele disse assim: “Não me peça para responder sobre o artigo que eu escrevi em 2004, porque esse artigo está muito velho, e muita coisa se alterou a partir de 2004”.
O que continha o artigo, Senador Cristovam Buarque? Repito: que a presunção de inocência tinha que ter um limite, ela não podia ser absoluta, como diz a Constituição. Que tem que fazer, sim, os vazamentos seletivos para a imprensa amiga, para minar o que resta de credibilidade do sistema representativo. E que o acusado, o delatado tem que temer, durante o período de prisão provisória, que algum outro acusado possa delatar em seu lugar e contar a narrativa que ele está se recusando a contar. E mais, e mais: que o acusado, para delatar, precisa temer o encadeamento da prisão provisória na sentença de primeira instância, porque aí, sim, ele vai ser forçado a delatar.
Eu considero, Srs. Senadores, que a delação é, sim, Senador Armando Monteiro, um caminho importante, muito importante para se conter o desvio de dinheiro público. Quando eu era Ministro da Justiça, eu defendia a delação, sem que a delação constasse da nossa legislação. Sempre a estimulei, mas a delação como existe, Senador Randolfe, nos outros países: a delação com provas, com sigilo. Em qualquer lugar do mundo civilizado, se uma delação vazar, como no Brasil, ela estará automaticamente desfeita.
Foi sobre isso que o Ministro Gilmar Mendes chamou atenção. Esses vazamentos seguidos e repetidos o que é que objetivam? Será que são propositais para anular as provas? Como isso continua a acontecer?
E o Supremo Tribunal Federal – e, mais uma vez, eu queria, como guardião da Constituição, assegurar o meu apoio –, o Supremo não pode conviver com isso, não pode conviver com isso; tem que pôr o limite, tem que guardar a Constituição. Este Senado da República, Senador Cristovam, por ocasião da Proclamação da República, cumpriu um papel importante, fundamental na construção do Estado brasileiro, e concedeu ao Supremo Tribunal Federal, ainda na Constituinte que foi feita pelos republicanos, ainda na Constituinte, ele concedeu ao Supremo Tribunal Federal exatamente o poder de guardião da Constituição e de Poder Moderador, exatamente pelo papel constitucional que reservou para a Suprema Corte do País.
Sr. Presidente, Srs. Senadores, no domingo – Sr. Presidente, e já encerro –, no domingo 19 de março, a ombudsman da Folha de S.Paulo Paula Cesarino Costa noticiou mais um acontecimento da indústria de abusos promovidos por setores do Ministério Público, da Polícia Federal, do Judiciário e da imprensa, que é outra coisa que a gente precisa esclarecer, é outra coisa. A operação não é da Polícia Federal, ela é também da Polícia Federal. As operações são todas da Polícia Federal, pedidas pelo Ministério Público e autorizadas pelo juizado de primeira instância, com segredo de Justiça e massificada, veiculada, de acordo com a necessidade de massificação pela imprensa nacional.
No domingo, a Folha de S.Paulo, a ombudsman da Folha de S.Paulo noticiou mais um acontecimento, repito, dessa indústria de abuso, Senador Omar. Seguindo o roteiro do artigo que acabei de citar do Juiz Moro, procuradores vazam seletivamente dados da investigação sob sigilo. Estamos vendo isso, nos últimos anos, todos os dias, todos os dias. Avançaram tanto que não se impuseram limites. E agora, Sr. Presidente, Srs. Senadores, inventaram uma tal de coletiva em off, coletiva em off, reunindo jornalistas para vazar trechos de depoimento de criminosos contumazes e confessos.
Neste momento da vida nacional, propostas são apresentadas para limitar o habeas corpus e legalizar provas ilícitas, além, Srs. Senadores, da publicidade opressiva dirigida ao Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição. Tenhamos olhos para ver! O País atravessa momentos difíceis: além da forte crise econômica, existe uma tensão institucional alimentada por uma operação que, apesar dos seus inegáveis méritos, repito, não admite qualquer contestação aos seus atos eventualmente nocivos a direitos e garantias individuais.
Para agravar o quadro subjacente ao monturo de investigações, muitas delas, repito, desnecessárias, observou-se que prisões preventivas se tornaram regra e delações premiadas se materializaram a partir de acordos construídos exatamente para envolver importantes personalidades da política brasileira – aqui no Brasil, tal qual lá na Itália.
Longas investigações não apuraram qualquer elemento para justificar o meu indiciamento. Não apuraram e não apurarão. Em junho de 2016, o inquérito divulgado como devastador e que ensejou a abertura de outros igualmente vazios foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal em relação a mim.
Venho me perguntando quais os interesses subjacentes às ações aparentemente orquestradas contra o sistema representativo e às iniciativas para limitar o habeas corpus e legalizar essas provas ilícitas. Sob os holofotes da mídia, o Senado Federal foi invadido no ano passado, a partir de um mandado ilegalmente concedido por um juiz de primeira instância. Apreenderam, Sr. Presidente, equipamentos de varredura ambiental já emprestados por mim, várias vezes, à própria Polícia Federal. Recolheram documentos e prenderam o Diretor geral da Polícia Legislativa. A falaciosa acusação era de obstrução à sacrossanta Operação Lava Jato. A verdade: uma rusga entre servidores das duas polícias – da Polícia Legislativa e da Polícia Federal. Os servidores da Polícia Legislativa, Senador Jorge Viana, que não queriam trabalhar: eu fui obrigado a veicular um vídeo em que eles confessavam que passaram num concurso, que tinham um salário muito bom, mas que tinham que compatibilizar a sua função de Polícia no Senado Federal com outras funções que eles haviam anteriormente assumido.
Confesso a V. Exªs que, naquele instante, me lembrei, Srs. Senadores, de um episódio muito conhecido, envolvendo o Ministro Alvaro Ribeiro da Costa, então Presidente, Senador Jader Barbalho, do Supremo Tribunal Federal, que mandou entregar as chaves da Corte Suprema ao Presidente Castelo Branco. Para muitos que se recordam, em 1964, o General Castelo Branco não só cassou seis Ministros do Supremo Tribunal Federal como elevou o número de Ministros do Supremo Tribunal Federal para dezesseis. Diante dessa circunstância, o então Presidente do Supremo Tribunal Federal fechou o Supremo Tribunal Federal, colocou as chaves do Supremo Tribunal Federal num envelope e mandou entregar as chaves do Supremo Tribunal Federal ao General Castelo Branco.
Eu sinto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, o odor de enxofre dos tempos da ditadura. Verdadeiros prêmios concedidos a delinquentes delatores e algumas declarações de personalidades respeitadas no cenário nacional sobre a bagunça em que se transformou o País acabaram por estimular, ainda mais, a minha curiosidade e a curiosidade desta Casa.
O advogado e constitucionalista Pedro Estevam Serrano observou:
O problema não é a delação, mas o modo como a delação tem sido obtida. Para sair da preventiva, que ainda não foi julgada, é preciso dizer algo. E mais [lembrava Pedro Estevam Serrano]: é preciso uma confissão que agrade a hipótese do investigador.
Confissão que agrade a hipótese e traga narrativa, ainda que mentirosa, sem qualquer documento, mas suficiente para expor principalmente Parlamentares, previamente julgados pela opinião pública manipulada.
Sintomática, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é a nota publicada na coluna do acatado jornalista Ancelmo Gois, em 21 de dezembro de 2016, classificando como obsessão fatal a reiterada pergunta dos membros do Ministério Público Federal feita aos 77 delatores da Odebrecht. Lembrava Ancelmo Gois, em sua respeitada a coluna de O Globo, que a todos os delatores da Odebrecht foi feita uma única pergunta: “E o Renan? Vocês sabem, por favor, alguma coisa sobre o Renan? O que é que vocês têm a dizer do Renan? Digam”. E ouvi isso de pessoas que não mentiriam. Até o delator Cláudio, que fez aquela primeira delação veiculada, vazada de propósito da Odebrecht, Senador Jader Barbalho, tivera a sua delação recusada pelo Ministério Público, porque não acrescentava nada, absolutamente nada. E ele depois foi chamado e disseram: “Nós só temos uma maneira de validar a sua delação. A sua delação não acrescentou nada, absolutamente nada à investigação. Nós só podemos aceitar a sua delação se você indicar essas pessoas e puder apresentar alguma prova contra essas pessoas.” E o delator voltou para o interrogatório e disse que, quando falava com determinado Senador, ele tinha a impressão de que aquele Senador – um absurdo, uma mentira, uma inverdade que eu quero repelir daqui – falava em nome de outros Senadores. Isso, Senador Humberto, não pode continuar.
Uma ameaça sempre no ar contra todos nós; um interminável suspense. Sigilo e recato revelado a conta-gotas para a mídia. Nesse ritmo, Sr. Presidente, como todos sabem, sobram fatos sem explicação, sem absolutamente nenhuma explicação. A grande maioria dos delatores não me conhecia – repito já para concluir –, e outros simplesmente interpretavam situações ou entendiam que terceiros falavam em meu nome.
Por que exatamente os membros do Ministério Público rejeitados pelo Senado Federal para compor o Conselho Nacional do Ministério Público ocupam posição de destaque nas investigações envolvendo Senadores? Senador Randolfe, é o fim do mundo colocar numa investigação para investigar o Senado, uma das principais instituições da República, pessoas que foram rejeitadas pelo Senado Federal! Isto é, no mínimo, temerário: pessoas que foram rejeitadas pelo Senado, como Vladimir Aras, Nicolao Dino, Wellington Saraiva, investigando o Senado Federal! Isso não pode continuar.
Por que razão, Sr. Presidente, o Ministério Público rejeitou as delações da OAS? Se era importante, por que foi engavetada a delação da OAS? Qual teria sido o verdadeiro motivo para pôr o esparadrapo na boca dos delatores da OAS? Por que criminalizar o sistema representativo e a política? Por que proteger uns e crucificar outros tantos? A quem serve essa investigação?
Raul Zaffaroni, ex-Ministro da Suprema Corte Argentina e um dos maiores penalistas do mundo, com seu espírito arguto e visão histórica, advertiu:
Excepcionalidade foi o argumento legitimador de toda inquisição da história, desde a caça às bruxas até hoje, através de todos os golpes e ditaduras subsequentes. Ninguém nunca exerceu um poder repressivo arbitrário no mundo sem invocar a “necessidade” e a “exceção”, mas também é verdade que todos eles disseram hipocritamente estar agindo legitimados pela urgência de salvar valores mais elevados contra a ameaça dos males de extrema gravidade.
Investigação precária, intempestiva, sem apresentar provas que assegurem o envolvimento do acusado, termina por acarretar em prejuízo sem precedentes à vida pessoal, profissional e social de qualquer pessoa.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada em dezembro de 1948 sob o ideal comum de promover o respeito a esses direitos e liberdades, estabeleceu:
Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.
Antecipação de juízos condenatórios, Sr. Presidente e Srs. Senadores, viola garantias constitucionais e o próprio Estado democrático de direito. O estigma tenta, como disse, encobrir, em alguns casos, a verdade. Onde predomina o preconceito e a antipatia os fatos são escondidos ou manipulados para servir a diversos interesses.
Percebe-se, Sr. Presidente, a existência de movimentações arquitetadas para gradativamente empurrar a representação popular para uma esquina maldita e desacreditar o Parlamento brasileiro. É evidente que isso não faz bem à democracia, mesmo à jovem democracia brasileira, que precisa, como já disseram, ser regada todos os dias. O propósito é criminalizar doações de pessoas jurídicas destinadas para campanhas eleitorais, expressamente permitidas pela legislação até 2014, apesar de auditadas e aprovadas pela Justiça Eleitoral.
A legislação, Sr. Presidente – permitam-me lembrar outro caso –, determinava o modelo de financiamento da disputa eleitoral e, por isso mesmo, constitui rematado absurdo responsabilizar o candidato ou seu partido político exatamente por ter cumprido a lei e agido com transparência, na forma da lei. Será que vamos – outro dia lembrou aqui o Senador Jader Barbalho – ter de recorrer a cartomante, a partir de agora? Se nós vamos, na próxima eleição, pôr em execução uma lei eleitoral e se a execução dessa lei será admitida como legal daqui a cinco anos, daqui a seis anos – só uma cartomante poderá dizer se isso vai ou não acontecer pela tentativa indiscriminada de criminalizar, permitam-me a redundância, essas doações.
Confio, Sr. Presidente – já encerrando –, que a Corte Suprema saberá separar o joio do trigo, afastando a tese de lavagem de dinheiro por meio das doações de campanha, baseada em meras suposições defendidas pelo Ministério Público e pelos órgãos de comunicação de massa. Acusações sem fundamento, obscuras, seletivas, contaminadas pelo espírito de emulação prestam um desserviço à persecução penal que se pretende, Sr. Presidente e Srs. Senadores, séria. Caça às bruxas aconteceu na França, com o estabelecimento do regime de terror. Durante vários anos, as boas intenções foram superadas pelo fanatismo alucinado de falsos pregadores.
Sr. Presidente, eu quero mais uma vez agradecer a oportunidade que V. Exª me concede.
Permitam-me os Senadores tomar o tempo dos senhores e das senhoras exatamente para que nós possamos colocar esse debate e trazer para esse debate quem dele quiser participar, do Supremo Tribunal Federal, do Ministério Público, da Polícia Federal, da Advocacia, quem quiser participar.
Eu queria, mais uma vez, cumprimentar o Senador Eunício Oliveira, que ontem, numa sábia decisão, numa sábia decisão, estabeleceu, a partir de um requerimento, um cronograma para que nós tenhamos aqui no Senado Federal a discussão do fim do foro especial com prerrogativa de função.
Sr. Presidente, com a mesma legitimidade com que faço essas colocações, eu queria lembrar que em 2013, em junho de 2013, com o povo nas ruas, com esta Casa deliberando sobre uma agenda nacional, eu tentei várias vezes colocar em votação essa mesma proposta do Senador Álvaro Dias para acabarmos, para pormos termo, fim ao foro especial com prerrogativa de função. Naquela época, tal como hoje, de maneira casuística, os jornais que hoje defendem o fim do foro especial fizeram editoriais dizendo que aquilo era um esforço que o Senador Renan Calheiros estava fazendo para ampliar as instâncias recursivas da operação que, na oportunidade, atingia principalmente o Partido dos Trabalhadores, na operação que atingiu o Partido dos Trabalhadores. Então, o mesmo argumento, o mesmo argumento que levou esta Casa a não votar o fim do foro em junho de 2013 – o mesmo argumento – está sendo usado hoje para dizer que o Senado Federal quer se beneficiar do foro especial, como a passar para a sociedade a ideia de que ser julgado pelo Supremo é ser julgado para a impunidade; não é, Sr. Presidente, não é.
Então, façamos o debate. Vamos trazer para aqui todos para que nós possamos discutir. Simultaneamente, Senador Cristovam, vamos também poder discutir os temas conexos que, juntamente com esse tema, tramitam aqui no Senado Federal. Acho que esta Casa, mais do que nunca, tem de se abrir ao debate, tem de ser abrir ao debate, tem de trazer todos aqui – a exemplo do que fizemos com o Juiz Sérgio Moro – para que possam, desta tribuna, externar seus pontos de vista, trazer seus argumentos para construir com um Brasil melhor.
Sr. Presidente, mais uma vez muito obrigado. Meus cumprimentos a V. Exª.

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